domingo, 11 de setembro de 2016

Onde você estava em 2001?

"Como os artistas lidam com a questão da memória? Nas artes, a evocação das memórias pessoais implica a construção de um lugar de resiliência, de demarcações de individualidade e impressões que se contrapõem a um panorama de comunicação à distância e de tecnologia virtual que tendem gradualmente a anular as noções de privacidade, ao mesm      o tempo que dificultam trocas reais. É também o território de recriação e de reordenamento da existência - um testemunho de riquezas afetivas que o artista oferece ou insinua ao espectador, com a cumplicidade e a intimidade de quem abre um diário." Katia Canton, Tempo e Memória
Memorial do WTC por Denise Gould

          Havia quem estivesse em casa apenas esperando o horário da aula. Teve quem dissesse: "nem sei o que estava fazendo, sério, talvez no trabalho". Para uma série de pessoas o expediente foi encerrado no momento em que ouviram as primeiras notícias, correram, então, para casa, afim de acompanhar as notícias. Também houve quem estivesse no cassino dos oficiais, servindo o melhor vinho do quartel a um dos generais. "Como em muitos dias, eu estava a varrer o chão esperando a hora dos desenhos, pelo menos até a vinheta do Plantão da Globo começar". A música, de autoria de João Nabuco recebeu o maior número de menções nas respostas, ainda que tenha passado a ser exibida apenas em 1991 as pessoas parecem tratá-la como um som que sempre existiu no imaginário. Outro prossegue em um riso curioso "Eu estava trabalhando na hora, sei que o João Gordo estava dormindo e então um cara ligou para avisar a ele", é uma entrevista? De certa forma era.
             E motivada por uma curiosidade recorrente, em abril de 2013 numa troca de virtuais cartas com Kariny Cristina ela havia, também, surgido. Naquele momento, sem maiores repercussões. "Estava na Marquês de São Vicente aquele dia. Podíamos trabalhar com um daqueles radinhos, sabe? então todo mundo acabou sabendo ali, por volta das dez da manhã.", outra pessoa complementou "nessas horas que a gente confirma como notícia ruim chega rápido, lembro que era uma terça, nesse dia o carteiro sempre fazia as entregas, foi ele quem nos disse. Ficamos apavorados, teve quem dissesse ser a terceira guerra mundial". Para alguns a repercussão dos ataques chegou apenas no horário da tarde. "Bem, não é difícil, eu estava vivenciando a mesmice, trabalho há vinte e cinco anos no mesmo lugar, sei lá, acho que eu trabalhava apenas em uma sala diferente." Outras pessoas iam além, não se tratava de intuir que estava no trabalho, e sim de tentar lembrar em qual estágio profissional estava.
             A sensação de deslocamento do tempo, foi a impressão que recebi de muitos com quem falei na última sexta-feira, 9 de setembro. Não se tratava de relativizar a importância global do fato, mas buscar a esfera de reação pessoal de uma série de brasileiros de idades variadas. Em meio a tumultos diários muitos esquecem de desmecanizar a própria vida. A tragédia foi um meio indireto para que cada entrevistado focasse, por alguns instantes, em si mesmo. Numa esfera mais ampla me peguei pensando: Para quantas pessoas o momento da queda do WTC não foi o nascimento da atenção para o panorama-cartão-postal de Lower Manhattan que passaria a ser visto em uma série de filmes, retroativamente? Naquele dia, minha maior preocupação era assistir a um episódio de Dragon Ball Z que, por conta da cobertura dos ataques, nunca chegou. As aulas de geografia, ministradas pelo profº Isaac de Carvalho, salvo melhor juízo, levaram a discussão para as aulas em que fiz uma ilustração do rosto de Osama Bin Laden para a capa de um trabalho escolar.

             E você, onde estava em 2001?

2 comentários:

  1. Oie...gostei do seu texto...
    'estava com 6 anos, estava na escola quando a tragedia aconteceu, quando cheguei em casa minha mãe estava chorando"....naquela e´poca não importava, só depois de alguns anos me dei conta do que realmente tinha acontecido...

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    1. Saudações em fm, jovem na anonimidade! Muitos acontecimentos vão ecoar em nós à posteriori. "Perdi" os Mamonas Assassinas aos 6, e ainda tenha entendido a passagem para outro plano isso foi fazer sentido anos mais tarde, nos pensamentos do que poderiam ter feito. Toda sorte de tragédias nos cercam e a vida sempre segue!

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