domingo, 25 de março de 2018

O Amor Virá

Love Will Come Through foi o terceiro single lançado pela banda escocesa Travis para divulgar seu quarto álbum de estúdio: 12 Memories. O single estreou em 22 de março de 2004. Foi composta por Fran Healy. Ainda que conhecesse os singles Sing e Side, foi apenas quando conheci a faixa Re-Offender transmitida pela MTV Latina que a banda capturou minha atenção. Mesmo minha intenção de um dia conhecer algo de canto gregoriano no mosteiro de São Bento cresceu após ouvir a canção J. Smith. O Amor Virá surgiu de minha vontade de versionar uma das canções que tem uma alegria autocontida. Gosto muito das melodias dessa banda e é uma forma de poder homenageá-los à minha maneira.




O Amor Virá
Versão para Love Will Come Through da banda Travis

Se te conto um segredo
Você guardaria pra si
Sem dizer a viv'alma?
Está a me consumir
Não consigo dormir
E mentir, levou a minha calma

Pois então,
Pegue pra si
Só cuidado 
Com a vertigem
Se o mundo não gira
O seu peito não vira
Um lugar preenchido com nada

Então leve contigo
Me leve, contigo
Baby, o amor virá
Só te espera chegar

Mesmo na encruzilhada
Em meio a estradas
Eu sinto que certo está
Se o que sinto é verdade
Não há faz de conta
Na pomba que ouço voar

Olhe o céu, e tome pra si
Só cuidado com a vertigem
Se o mundo não gira
O seu peito não vira
Um lugar preenchido com nada

Então leve contigo
Me leve, contigo
Baby, o amor virá
Só te espera chegar

O amor virá...


segunda-feira, 12 de março de 2018

Síntese - 5 a Seco

"Sou muito fã não só de 5 a Seco, mas de uma geração de criadores que está espalhada. Em São Paulo está muito evidente, tem uns dez ou doze de uma mesma geração compondo lindamente, fazendo uma música bacanérrima e tal, e isso está espalhado pelo Brasil, em todos os cantos, por isso que eu não acredito quando alguém reclama da música brasileira - a música brasileira vai muito bem, minha gente, eu tenho ouvido tanta coisa bacana, cara. O danado é que, com essa coisa do digital, tudo foi pulverizado, então não existe mais essa coisa de poucos que falam pra milhões. Não, agora é milhares falando pra milhares, é assim. Então, você tem uma dificuldade maior de achar as coisas, mas a tecnologia foi acessível demais pra todo mundo fazer seus trabalhos. Tem muita gente ali fazendo, o negócio é saber procurar” Lenine, em entrevista à André Medeiros para o Monkeybuzz em 2015


         Quando conheci o trabalho do 5 a Seco, minha primeira lembrança foi o show "Os 5 no palco" de 1998. Em que Chico César, Lenine, Zeca Baleiro, Paulinho Moska e Marcos Suzano reuniram suas individualidades musicais em uma série de apresentações declarando a força de uma, então, nova MPB. Cerca de uma década depois, a música brasileira apresentava outra renovação, essa, consolidada com Leo Bianchini, Pedro Altério, Pedro Viáfora, Tó Brandileone e Vinicius Calderoni. Todos, cantores, compositores e instrumentistas. Cantautores na melhor definição, de modo que, não haja um centro, uma força que responda acima dos outros.
         Eles chegam em 2018 declarando a "Síntese" dos elementos que compuseram suas obras anteriores Ao Vivo no Ibirapuera (2012) e Policromo (2014). Se o primeiro trazia um repertório construído na estrada e calcado nos violões, instrumento de origem de cada um deles, o segundo, gravado em estúdio flertava mais com as possibilidades do estúdio, dos timbres, das guitarras. O que sobra ao terceiro? Extrapolar a construção dos arranjos de maneira minimalista, apostando teclados em teclados e sintetizadores inquietos nos quais os ouvintes (re) descobrem as líricas e o pensamento lógico nas letras dos cinco autores.
Várias das treze canções que compõe Síntese vinham sendo apresentadas pelo grupo, tanto nas apresentações, quanto em vídeos em que os protagonistas munidos de seus violões performavam as composições em seu mínimo múltiplo comum. Olhando a repercussão do álbum em comentários no YouTube, pode se notar, que isso causou um estranhamento para parcela dos ouvintes. Para aqueles que se deixaram surpreender com o lançamento pode haver reações mistas, ainda assim, o resultado é satisfatório.
         O álbum abre com a parceria de Leo Bianchini e Vinicius Calderoni: Na Onda. Com uma letra na qual a estrofe desabrocha como numa matroska triangular (Será/Será você/Será você a sucursal do céu) pode ser cantar o lado positivo de topar com alguém que te dá sorte na vida, e aí, você agarra e não larga. O preenchimento da bateria é um destaque aqui. Pelas tantas a palavra "pasmaceira" tem um quê de Não Tem Paz, do Policromo. Um dos grandes destaques vem em seguida: Ventos de Netuno (Pedro Altério e Pedro Viáfora). A primeira estrofe "Pra poder viver o amor/Tem primeiro que se amar/Se for de verdade/Há de prosperar" já carrega significados com múltiplos, partidas que não se desejam mas nos surpreendem na vida. A guitarra, as palmas e a programação transportam para o turbilhão dessa ventania. Há pesquisas científicas apontando que as rajadas de vento em Netuno podem alcançar velocidades mais de dez vezes mais fortes que as encontradas na Terra. Quantas vezes uma pessoa pode ter uma presença igual?
         Ela, Ele e Eu é uma balada de Ricardo Teté e Tó Brandileone aos moldes de Pra Você dar o Nome. Soa a hit. Brisa é Composição de Vinicius Calderoni que versa sensível sobre a "brisa" de uma companhia de tornar feliz sem motivo. A faixa solo de Pedro Viáfora, Lua Cheia, traz uma das letras mais atuais, sobre a importância de partilhar o bem em tempos que muros são levantados e há medo, falta de alegria e ódio. É um tema presente no cancioneiro brasileiro, talvez com proeminência no rock dos anos 80, a diferença é que a proposta feita ao final (Vem cá, a lua tá cheia, vamos contar histórias...) é carregada de uma boa intenção que pode soar inocente em tempos cínicos, mas é o contraposto preciso.
O Mar Dentro da Concha vem com Leo Bianchini à frente é um groove animado com uma letra com um eu-lírico que se atrasa ao olhar "coisas extraordinárias", tais, o ato de espirrar, o gelo derreter, um clips de papel. Como quem afirma que a tecnologia das presilhas para cabelo é tão impressionante quanto a física moderna ou o mito da caverna.
         De Pedro Altério e Tó Brandileone é a sétima canção: Pensando Bem. Canção discorrendo as faltas e os "se". (Me fez pensar em O Sonho, do Policromo, e é bom constatar que, as canções evocam composições do mesmo coletivo). Tempo de se Amar carrega o assobio da canção anterior e, conceitualmente, pode trazer uma elaboração de Lua Cheia quando o eu-lírico diz que quando enfim saltou no cais e ao invés de muros viu quintais vislumbrou a felicidade. Coisas Demais, de Leo Bianchini, Pedro Altério e Pedro Viáfora é outro ponto de alto do álbum, com uma letra concisa. Dá a impressão de ter sido criada como poema e músicada posteriormente. Discorre, sobre a solidão contemporânea de multidões e silêncios e a vida que nos escapa. Depois, canção de pai e filho, Celso e Pedro Viáfora vem O Dia de Encontrar Você. (Ou muito me engano ou há ecos de Épocas?) curiosamente tensa "Eu sei que era só chamar/Só que não sei seu nome/Tem vezes que ouço assim/Tão tim tim por tim tim/Seu passo atrás de mim/Mas quando eu me viro você some" a faixa tem o trabalho vocal característico e um instrumental que instiga. 
         A trinca final começa com Maneiras e Maneiras, uma canção que me lembrou a produção do álbum Despertador de Léo Cavalcanti, pela forma como trabalha com as intervenções eletrônicas. Tem um riff de guitarra com aquela cara de Ecos do Ão de Lenine. A bateria leva muito bem até o momento do pico com o falsete. Deve ser interessante de observar como é o andamento dela ao vivo. Outra faixa com às guitarras à frente: Antídoto é uma parceria de Pedro Altério e Vinicius Calderoni e também se coloca como Lua Cheia as malezas que nos cercam "Por onde começar, não sei/Simbora descobrir/Um antídoto pra dor feroz/Que quer nos consumir". A meu ver, essa canção é o verdadeiro final do álbum. Com o brado "onde o sonho estiver, estarei". Dessa forma, Canção de Lá, de Léo Bianchini e Vinicius Calderoni soa mais como um epílogo com seus versos construídos apenas com palavras soltas. Melodicamente, é claro, ela é capaz de acalmar os ânimos e concluir a Síntese.
         A soma final é positiva, embora, em primeiras audições, alguns elementos eletrônicos soem fora de lugar, a intenção dos integrantes era renovar um som que, não fosse a inquietude, poderia ficar apenas como uma reprise do primeiro trabalho em estúdio. Quando consideradas outras bandas com uma ou duas forças criativas, o 5 a Seco aparece praticamente como uma banda de "greatest hits". Cada um dos cantautores se potencializa no crescimento conjunto e permite que a identidade do som seja pautada pela mutação. Depois de tese, antítese e síntese, o que virá?

segunda-feira, 5 de março de 2018

Vanguart em Santos

O mês de março está movimentado para a banda Vanguart. No dia 14 de março participarão de  m"Sessions 89" no Z Carniceria. Dia 17 estarão no Teatro Lauro Gomes em São Bernardo do Campo e dia 23 a banda tocará pela segunda vez no Lollapalooza Brasil, um evento com potencial para apresentar o trabalho para um novo público. Essa movimentação teve início no primeiro sábado do mês com um acústico na Arena Club na cidade de Santos. Diferente dos outros shows comentados, repassarei as canções por álbum, do último ao primeiro. Em tempo: Os títulos das composições levam à um clipe.. 
Foto de Renata Custódio @minutodoshow


Faz o que você não fez pela primeira vez

        Beijo Estranho fará um ano em abril. Com o lançamento do clipe Todas as Cores no fim de fevereiro esta se torna a terceira faixa do álbum a ganhar maior exposição. Após tocá-la, a banda relembrou de quando participaram da Virada Cultural Paulista em 2012. Àquela altura, contavam ainda dois álbuns em estúdio. Momentos dessa apresentação podem ser encontrados no YouTube. Em Eu Preciso de Você, Hélio tocou seu trompete com surdina para abrir e encerrar. Ele pontuou a presença de referências à poetas como Drummond, Walt Whitman e Hilda Hilst - se alguém souber qual é a de Hilda me contem, fiquei curioso* - e dedicou aos novos poetas que estivessem presentes. Fernanda Kostchak assumiu o microfone para agradecer a presença do público explicando as Felicidades de poder apresentar as músicas como elas surgiram. As "canções como a banda toca entre eles". Ou mesmo em Lives nas redes sociais como a recente Não Tá no Setlist ou uma em que Fernanda chegou a indicar compositores como Johannes Brahms e Gustav Mahler.
      Quando tocaram E o Meu Peito Mais Aberto Que o Mar da Bahia, houve grande comoção do público que percutiu cada um dos refrões com suas palmas. N'alguns momentos do canto, Hélio emulou um grave no melhor estilo Tim Maia. O quarteto admitiu que o "laralara", tão característico, foi a última coisa que gravaram para o disco e apenas depois de muitos conflitos sobre se deveria ou não entrar. Beijo Estranho encerrou a apresentação cantada à plenos pulmões. Com dois violões, violino e trompete a banda se mostrou em grande momento. A versão de estúdio tem um piano bem forte, no entanto, sua ausência não foi sentida. O violino seguiu causando arrepios coletivos numa música que ainda terá muito tempo de estrada.

O Que Seria de Nós?

         O álbum "divisor de águas" foi representado em peso. Muitos fãs de outrora acharam estranho o calor presente nas canções, outros tantos conheceram ali e se apaixonaram. Fato é, que em maior ou menor grau, muitos se renderam à Muito Mais que o Amor. A abertura foi com Estive. No pré-show, sucessos dos Beatles tomavam a casa. De acordo com a banda, a intenção era que entrassem no clima. O multi-instrumentista David Dafré foi apresentado como o músico que mais trocaria de instrumentos no show e com a sofisticação habitual (bandolins, violões de seis e doze cordas, lapsteel, clarinete, meia-lua, além de backing vocals! Versatilidade define). Quando tocam Demorou Pra Ser fica fácil perceber como essas canções lançadas em 2013 seguem angariando público. As letras evocam emoções identificáveis de cara. Como um casal em início de relação trocando juras: antes que eu soubesse já estava com você ou você é a vida da minha vida, por exemplo. Eu Sei Onde Você Está é sucedida por uma versão exclusiva de Reginaldo para a romântica Mesmo de Longe e ao final de Olha pra Mim, Hélio aconselha ao público guardar algumas fichas para apostar em si mesmos e não colocar todas as fichas no "outro alguém". Pelo Amor do Amor entregou à Santos dois grandes momentos. Um quase incidente no palco com Fernanda rendeu o alongamento do solo, como ouvido abaixo:


         As versões ao vivo são construções vivas e isso as torna um modelo ideal. Por mais a ouçamos nos discos, LP's ou streamings é no palco que as coisas se transformam. Como o poema declamado por Hélio em seguida:

"Um sinal do céu. Um telefone que podia tocar.
Como um dia em que, pela porta de trás da casa vazia,
Você ingressaria e me veria confuso por te ver.
Noites sozinho. Noites sozinha, lembra?
Tudo antes de ser. Eu tinha outro nome, você também.
Até que um dia te vi na rua e algo reconheci."

A menção à Valsa Brasileira de Chico Buarque dá mostras de quão abrangentes são as influências dos integrantes. Fechando os trabalhos do terceiro disco, entrou outra composição que figura na memória afetiva de muitos: Meu Sol.

O Que eu Não VIvi, eu Tô Indo Ver!

         No público, as mais diversas histórias. Haviam moradores da cidade ansiosos para rever o grupo. Havia quem estivesse à trabalho. Até mesmo quem já vivera na cidade e encontrou, no show, motivo para fazer as pazes com o lugar. Havia gente das proximidades: Itanhaém, Cubatão. Gente que precisaria correr para chegar à Praia Grande. No meu caso? Estava pela primeira vez na cidade que conhecia apenas por conta de Roberto e Erasmo, Mamonas Assassinas e Charlie Brown Jr. A questão é que centenas de pessoas estavam reunidas em virtude de admirar a arte daquele divertido quarteto no palco da Arena.


Proximidade da Plateia
         Outra parte da apresentação foi representada pelas composições do álbum Boa Parte de Mim Vai Embora. Para uns obra máxima do grupo, para outros "o disco deprê", que não deve ser nomeado.Começou com ...Das Lágrimas, primeira composição com as cintilantes linhas de Fernanda. Passando pela visceral Nessa Cidade que, como sempre, me colocou a refletir. Reginaldo comentou que no período "a gente não sofre mais nem por antecipação nem por amores que não valham a pena". Essa é justamente a questão.
        Quando se faz o juízo desse valor agregado? É preciso traçar rotas outras, forjar novas memórias em caminhos desconhecidos por aqueles que já não são dois? Além de divagar, talvez, me repito: quando do lançamento do segundo disco ela se mostrou uma das favoritas na apreciação melódico-poética. Anos depois, situações descritas na letra faziam parte de minha vida de forma que, mesmo presente no show de abertura da turnê atual no Teatro Paulo Autran, fui incapaz de escrever o que fosse relativo. Por ser, naquela noite, afetado emocionalmente. Já em Santos, o violão de doze cordas me manteve atento à nuances da música fluindo. 
         Numa matéria de Marie Eliis publicada no Medical News Today em 2013 dizia que pesquisadores no Japão concluíram que a audição de canções tristes pode levar os ouvintes a experimentar emoções ambivalentes. Uma vez que, a emoção induzida pela música, não é como a induzida por eventos pessoais. Esse pode ser um dos motivos para alguns artistas deixarem algumas composições de lado: uma vez que sua relação é direta e se entregar em canções surgidas de experiências traumáticas pode causar desconforto contrário ao êxtase do momento da criação. Voltando à Santos:
         Faixa melancólica contra a apatia generalizada Se Tiver Que Ser na Bala, Vai e ela responde muito bem ao formato, uma vez que a leveza do arranjo ressalta os três atos poéticos. As canções do segundo álbum tem daquela noção morriseyana de Rubber Ring e isso se amplifica a cada reencontro. Penúltima canção do show. Mi Vida Eres Tu é o caso da canção de melodia upbeat esperançosa e um refrão em espanhol de uma conclusão, não necessariamente, positiva. Um doce-amargo simples apenas se analisado superficialmente. Os versos de A Noite Mais Linda do Mundo de Odair José sempre surgem para nos colocar os pés no chão. Nem tudo são mágoas, tampouco flores.

O Que Importa é o Que te Faz Abrir os Olhos de Manhã

         O homônimo de estreia contou com apenas duas canções em meio ao repertório, mas não por isso menos significativas. Para Abrir os Olhos (o link é para uma gravação de 2007 do canal de Ricardo Spencer, que, entre outras afinidades dirigiu os clipes de "Mi Vida Eres Tu" e "Meu Sol".) e Semáforo. Sobre a última, Helio comentou ter sido a primeira canção que compuseram em português, antes, tinham mil motivos para não dizer a verdade. É isso. A verdade está em sempre seguirem seu caminho em frente. Como se olhar para trás os fosse transformar em estátuas de sal. A banda poderia ter investido num projeto revisionista pensando nos dez anos do primeiro de estúdio em 2017, entretanto, na contramão disso, comemoraram o pulsar da banda com um álbum que reuniu expoentes dos três primeiros e apontaram novas possibilidades sonoras. Terminar o evento em conversas informais com os integrantes da banda e do Sindicato, conhecer outros fãs (até uma próxima, Douglas) só tornou o evento mais especial. Naquela manhã todos os presentes abriram os olhos de manhã e aguardaram o anoitecer como fosse a noite do primeiro encontro. E, mais uma vez, era. 


Da Esquerda para a Direita: Reginaldo Lincoln, Claudia Almeida, Fernanda Kostchak, Thais Dias, David Dafré, Thales Salgado, Hélio Flanders e Renata Custódio

*Fui informado posteriormente pela Cláudia que o trecho de Felicidades faz menção à Do Desejo, uma série de dez poemas, lançada por Hilda em livro homônimo em 1992. 

quinta-feira, 1 de março de 2018

Felinos

"O teu dorso condescende à morosa
Carícia da minha mão. Sem um ruído
Da eternidade que ora é olvido. 
Aceitaste o amor desta mão receosa. 
Em outro tempo estás. Tu és o dono 
de um espaço cerrado como um sonho." 
A um Gato, Jorge Luís Borges 

Gato e Rato, por Maurício Nascimento

 

Felinos (2009)
Música: Bruno Oliveira

As vezes sinto pena dos caninos
Que passam noites uivando
Seguindo seus instintos lupinos
Mas vejo a situação assim:
"É tão melhor para quem é felino"
E eu não sei. Eu não sei quem sou

Mas se felina for tua intenção
De encarcerar meu coração
Eu sou felino teu
No meio das marchas da noite
Entregar-me-ei

Venha com presas avassaladoras
No fim das contas eu não vou lutar
Domine-me que seja nas masmorras
Faça-me um gato daqueles que uivam pro luar



       Há muitos gatos na História, os vistos como divindades, como objetos de sacrifício. Outros simplesmente domesticados, em parte, por seus donos. Nunca tive gatos, longe de mim mencionar algo relativo e errar completamente. Se você leu até aqui e é apaixonada (o) por gatos, comente quais são os maiores predicados desses animais. Será ótimo conhecer mais. A literatura de Haruki Murakami está repleta de gatos. Na trilogia 1Q84, há uma parte dedicada ao conto de uma cidade dos gatos, por exemplo.Em 2009, eu ainda estava longe de conhecer a obra de Murakami. Tampouco havia lido Relatos de um Gato Viajante da escritora Hiro Arikawa, uma de minhas leituras mais espirituosas de 2017. Então o que me levou a escrever um poema chamado Felinos?
       A ideia era tentar criar o senso de uma paixão tão forte que, um dos lados, não se importa em ter a própria natureza trocada. Eis aí a brincadeira entre lupinos e felinos. (I'm talking about spectacular, consciousness-altering love). A questão é, escrevi. Dediquei. E as palavras ficaram ali. Num de meus cadernos (eis a era pré-moleskine 😮) até o momento em que Bruno enviou uma linha de baixo melódica e, enquanto buscava os acordes as palavras surgiram e, como adoro dizer, foram calçadas feito luva. Apenas dois acordes se repetem por toda a canção, o que a torna perfeita para jams.